Qual a sua lembrança com o Fusca? Iris comeu cordeiro pela primeira vez em Gramado. Marcos experimentou o tutu à mineira. Zizinho conheceu a festa italiana de Blumenau. Marinalva se apaixonou pelo Brasil. O Brasil se apaixonou pelos Besouros I e II, apelido dado aos Fuscas 1983 e 1973 por seus respectivos donos, o auditor fiscal José Severino Pinto, conhecido como Zizinho, e o funcionário público Marcos Andrade. "Você não imagina a satisfação das pessoas ao encontrar o Fusca na rua. Batem palmas, param os carros e vem bater papo, contar alguma história", comenta Zizinho.
Foi Zizinho, aliás, que propôs ao amigo Marcos a ideia de atravessar o país a bordo dos clássicos. "Sou do Clube do Fusca da Paraíba. Criei uma expedição chamada CFPB. Para a quinta edição, fiz a ele a proposta de me acompanhar até Gramado, num percurso que totalizava 9.353 km de ida e volta, passando por cidades como Ouro Preto (MG), Pedreiras (SP), Curitiba (PR) e Blumenau (SC)", explica. Houve quem chamasse a empreitada de maluquice, mas Marcos garante que topou na hora. "Estou pronto para viajar quando me chamarem. Eu tenho o carro do ano, mas uma viagem como essa é muito mais motivante em um Fusca", coloca.
As aposentadas Iris Nery, casada com Zizinho, e Marinalva Andrade, companheira de Marcos, também aderiram. "Imagine o que é você viver uma rotina familiar e a cada mês do ano fazer uma oxigenação de corpo e espírito como essa? Na estrada a gente procura conhecer a cultura de cada estado, as guloseimas", provoca Iris. De riso solto, Marinalva complementa: "Muito prazeroso, cada emoção de rachar. É muita coisa bonita que nosso Brasil tem". Questionadas a respeito do desgaste dos quase 600 km rodados por dia ao longo dos 23 que a viagem levou, as mochileiras asseguram que não houve nenhum. Ainda que os casais tenham optado por degustar a estrada bem ao estilo Fusca, com modelos originais, sem ar-condicionado. "Ele não foi feito para trabalhar com esse equipamento. É refrigerado naturalmente, a ventilação entra em tudo que é canto", diz Iris.
Valentes
Rostos sem rugas, lataria brilhando. Os carros parecem ter sido feitos sob medida para a jovialidade do quarteto. Como quem pede por uma viagem, as malas na dianteira, onde a maioria dos automóveis guarda o motor, anunciam a vocação aventureira dos Fusquinhas. Segundo os "papais-corujas", a despeito do que possa aparentar a idade, eles topam tudo. Nas ladeiras, deixaram muito recém-fabricado para trás. Na buraqueira das estradas brasileiras, foram valentes e não apresentaram nenhuma queixa. "O Fusca é o único carro que não tem idade", esbraveja Marcos, orgulhoso do possante. "É nosso filho", comove-se Marinalva. O carisma do primeiro carro fabricado pela Volkswagen transcende o tempo. Nas ruas, crianças e adultos cheios de curiosidade interpelam Zizinho e Marcos: "se vocês fossem vender, venderiam por quanto?". "Na estrada era o tempo todo assim. Mas o povo sabe que a gente não vende", sorri Zizinho.
A próxima viagem está em discussão. "Não conhecemos o Centro-Oeste e o Norte do Brasil. Quem sabe ano que vem?", comenta Zizinho. "Tá olhando o quê?", diz o Fusquinha 1983 desconfiado, quando seu dono aciona a buzina. Você duvida que ele topa?