Estado de Minas

Recall da Ford dá dores de cabeça a proprietários do EcoSport

Ford convoca consumidores para resolver problema de vazamento na mangueira do radiador, mas não tem componentes para todos. Vítima do defeito, consumidora ficou um mês sem carro


postado em 27/03/2015 08:30 / atualizado em 27/03/2015 08:41

O EcoSport de Juliana faz parte da campanha, mas espera a peça; já o da irmã, Adriana, apresentou o defeito, mas não entrou no programa porque é 2014(foto: Ramon Lisboa / EM / D.A Press)
O EcoSport de Juliana faz parte da campanha, mas espera a peça; já o da irmã, Adriana, apresentou o defeito, mas não entrou no programa porque é 2014 (foto: Ramon Lisboa / EM / D.A Press)

Há cerca de um mês, a Ford convoca, por meio de carta, proprietários do EcoSport, modelos 2012 e 2013, equipados com motor 1.6 Sigma, para substituição do parafuso de fixação do compressor do ar-condicionado e fixação da mangueira inferior do radiador. Conforme o comunicado, pode haver uma interferência entre a mangueira e o parafuso, o que os mecânicos das revendas autorizadas traduzem: tal interferência pode resultar na perfuração da mangueira, com risco de vazamento do líquido do radiador e possibilidade de superaquecimento do motor. Mesmo considerando os vários danos que isso pode gerar no motor, incluindo o de o carro não poder mais rodar, a Ford não considera que o defeito comprometa a segurança e, por isso, não convocou um recall, mas um “programa de satisfação ao cliente”, que inclui os modelos 1.6 produzidos de 29 de junho de 2012 a 31 de julho de 2013.

 

O problema é que as concessionárias da marca também não receberam peças suficientes para sanar o problema. A empresária Juliana Santos Dumont Ferreira Antunes recebeu a carta da Ford antes do carnaval, ligou imediatamente para uma oficina autorizada na tentativa de agendar o serviço e qual não foi a surpresa quando lhe disseram que nem sabiam de tal programa. Cinco dias depois, retornaram a ligação confirmando a campanha, porém com a informação de que o nome dela entraria em uma lista de espera para a realização do serviço tão logo a Ford enviasse as peças. Até o fechamento desta edição, Juliana ainda era a quinta na lista, sem previsão de chegada das peças.

 

A reportagem ligou para várias concessionárias Ford da capital. Todas trabalham com lista de espera e não sabem dizer quando os componentes irão chegar. “Dependemos da Ford”, diz uma atendente. Das revendas consultadas, a que tem menor lista tem 80 clientes à espera das peças; a de maior lista, cerca de 120. Em uma delas, a funcionária conta que chegaram 25 kits – que seriam compostos do parafuso e presilha do ar-condicionado e mangueira do radiador – no início da campanha, mas depois não receberam mais. Para outra, foram enviados apenas 15 até o momento.

 

Sobre a gravidade do problema e os possíveis danos – ao contrário das convocações de recall, a campanha não menciona o que o defeito pode provocar –, os consultores das oficinas autorizadas admitem que pode haver superaquecimento do motor caso a mangueira fure e o líquido vaze. “Mas isso não vai acontecer porque a peça vai chegar”, diz um deles, otimista. Mais cauteloso, outro mecânico alerta para o risco inclusive de o motor fundir. “Se o problema acontecer, a luz do superaquecimento vai acender no painel. Nesse caso, o recomendado é parar o carro, porque senão o motor pode fundir”, avisa.

 

Fizemos contato também com o Centro de Atendimento Ford pelo número mencionado na carta (0800 703 3673), que de nada adiantou. “Não se trata de recall porque não é um problema que ocasione acidente”, explica a atendente. “Mas o meu atendimento não faz agendamento”, continua, dizendo que é preciso fazer contato com uma concessionária da marca. A atendente também não soube dizer se há peças nem tampouco descrever o defeito.

ANO PASSADO Enquanto a Ford chama para a campanha proprietários dos modelos 2012 e 2013, a também empresária Adriana Santos Dumont Ferreira, dona de um EcoSport FreeStyle 14/14, sentiu literalmente na pele o superaquecimento do motor em outubro do ano passado, quando o veículo tinha apenas 600 quilômetros rodados e cerca de um mês de uso. O problema parece ser exatamente o descrito pela Ford na atual campanha. “Estava andando quando a luz da temperatura acendeu. Liguei para o atendimento Ford e disseram que poderia ser mau contato. Quando liguei o carro novamente, a luz acendeu de novo. O ar estava ligado e eu estava com meus filhos. Eles viram uma fumaça saindo do ar-condicionado. Era uma fumaça fria e não tinha cheiro de queimado. Não saía pelo capô, mas tive que abrir as janelas, pois era muita fumaça. Não tinha água no radiador, o reservatório estava vazio. Então o enchi, quando vi que a água estava pingando no chão. Liguei novamente para o atendimento Ford e pedi um reboque”, lembra.

 

O carro foi levado para a concessionária mais próxima e foi constatado um defeito de fabricação. “Não falaram exatamente o nome da peça que tinha que trocar, mas disseram que era uma peça que ligava a mangueira do ar ao radiador”, conta. Adriana relata que o defeito de fabricação foi assumido rapidamente e em momento algum foi questionado nenhum tipo de mau uso. A montadora assumiu o conserto em garantia (o veículo tinha apenas 600 quilômetros). O problema, novamente, foi a falta da peça para o conserto e essa é a principal causa da chateação de Adriana. “A Ford me deu um carro reserva por apenas cinco dias, mas o meu demorou 29 dias para ficar pronto. Achei um descaso enorme”, desabafa.

 

DIREITOS Para o advogado Henrique Freire, especialista em direito do consumidor, a campanha de serviço deveria ser um recall, já que existe a possibilidade de danos ao motor e a parada repentina do carro, o que pode, sim, comprometer a segurança. Sobre a falta de peças, ele afirma que a existência da peça para substituição do componente defeituoso é obrigação do fornecedor, que tem um prazo de 30 dias para sanar o defeito (artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor/CDC). Especificamente sobre a situação de Adriana Ferreira, ele considera que ela tem direito a uma indenização correspondente ao aluguel de um veículo durante os 24 dias que ficou sem carro. A opinião de Henrique é corroborada pelo advogado Geraldo Magela Freire, que vai além: “Entendo que o recall tem que ser praticado sempre que há a ocorrência de um defeito em série e não somente quando há risco à saúde ou à segurança dos consumidores, em razão da produção e comercialização em massa e pela proteção ao consumidor conferida pelo CDC”. E acrescenta: “O fornecedor tem que atender com a maior brevidade o consumidor, que comprou um produto para sua satisfação pessoal e não tem que ser obrigado a esperar pelo tempo que o fornecedor desejar”.

 

FORD RESPONDE Segundo a Ford, “a ocorrência detectada é a interferência de um dos parafusos de fixação do compressor do ar-condicionado junto à mangueira inferior do radiador. Para evitar essa interferência, o parafuso de fixação desse compressor será substituído por outro com novo dimensional, assim como a presilha de fixação da mangueira. Além da substituição desses componentes, o distribuidor deverá inspecionar a mangueira para identificar possíveis danos, ainda que em estágio inicial. Caso constatada qualquer avaria, a mangueira também será substituída”. A marca reafirma a posição de que o defeito não afeta a segurança e, por isso, a campanha é um programa de satisfação ao cliente”. Sobre as peças, a Ford diz que há estoque suficiente, mas acrescenta que cada caso será analisado.

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