Estado de Minas MULTAS

Quase 18 anos após edição do Código de Trânsito, motoristas ainda desconhecem infrações

Surpresas para motorista também vêm com erros de agentes e órgãos e falhas de sistema


postado em 13/06/2015 17:00 / atualizado em 16/06/2015 03:40

Médico questiona sinalização próxima a estacionamento, onde há marcas de canalização(foto: Aristóbulo Nunes Silveira/Arquivo pessoal)
Médico questiona sinalização próxima a estacionamento, onde há marcas de canalização (foto: Aristóbulo Nunes Silveira/Arquivo pessoal)
Há três meses de completar a maioridade, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) ainda tem artigos pouco conhecidos, apesar das diversas transformações e regulamentações ao longo destes quase 18 anos (Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997). Além disso, a lei mantém brechas, que dão margem a erros de autuação e injustiças por falta de adequação dos sistemas dos Detrans. Depois de tanto tempo, continua não sendo comum condutores receberem notificações pertencentes a outro veículo, ficando com o ônus de tentar provar a inocência. Assim como não foi resolvida a questão de atualização de endereço do antigo proprietário, depois de transferido o veículo, restando multas pendentes a cargo do novo dono. De maneira geral, equívocos das autoridades e desconhecimento por parte da população mostram que a tão apregoada educação está bem distante do ideal.

PECULIAR Gravíssima e agravada três vezes, o que gera multa de R$ 574,62 e sete pontos no prontuário, é a infração por “transitar com o veículo em marcas de canalização (artigo 193/CTB)”. A autuação surpreendeu o médico Aristóbulo Nunes Silveira, que, como muitos motoristas, não sabia do que se tratava. Pesquisou, voltou ao local (ver foto), fotografou e aponta problemas. Seu erro foi passar pelas marcas de canalização ao entrar num estacionamento que fica na esquina da Rua da Bahia com a Avenida Álvares Cabral, no Centro de Belo Horizonte. Silveira alega que a sinalização é confusa, uma vez que há muitos elementos, mas não existe placa proibindo o acesso ao estacionamento.


Responsável pela engenharia de tráfego da cidade, a BHTrans explica que as marcas de canalização, também conhecidas como “áreas zebradas”, fazem parte da sinalização horizontal de trânsito e têm como finalidade orientar os fluxos em uma via, direcionando a circulação de veículos e regulamentando as áreas de pavimento não utilizáveis. A empresa explica que, quando na cor branca, servem para direcionar fluxos de mesmo sentido e para proteção de estacionamento. E, quando amarelas, direcionam fluxos de sentidos opostos. Além da infração por transitar em cima da marca (artigo 193), é proibido estacionar (artigo 181/VIII) ou parar (artigo 182/VI) em cima das marcas.


A Guarda Municipal, que, junto da Polícia Militar, é encarregada da fiscalização, acrescenta que o motorista deve estar atento à lei, pois “transitar” com o veículo em tais marcas não significa necessariamente trafegar por um período ou determinada distância. Basta que, em uma manobra, uma das rodas passe por cima da área regulamentada para que seja configurada a infração.

DÍGITO TROCADO Bem mais clara – porém mais séria – foi a situação por que passou Cleso da Silva, morador de Sete Lagoas, na Região Central. Ainda com carteira provisória, ele recebeu uma autuação por conduzir veículo com a habilitação vencida, na cidade de Juiz de Fora, na Zona da Mata. A primeira reação foi de espanto, já que Cleso nunca havia ido a Juiz de Fora. Um erro de digitação foi identificado pela delegacia de trânsito, em Sete Lagoas. “A placa do meu carro era GVU e a do outro motorista tinha letras parecidas. Pelo que me lembro, o agente trocou um U pelo V e a multa foi parar no meu carro”, conta Cleso. “A sorte foi que o outro condutor foi parado e havia assinado a notificação”, continua. Mesmo diante das evidências, ele teve que entrar com recurso para provar sua inocência e corria o risco de perder a carteira, por se tratar de uma infração gravíssima e sua habilitação ainda ser provisória. “Tive que pagar um advogado para ganhar o recurso”, observa.


O artigo 281 do CTB, em seu parágrafo único, inciso I, diz que “o auto de infração será arquivado e seu registro julgado insubsistente, se considerado inconsistente ou irregular”. Situação que parecia óbvia no caso de Cleso da Silva, mas a burocracia do recurso não foi dispensada.

DO ANTIGO DONO Sorte não é a palavra mais adequada para Cleso no quesito multas de trânsito. Superado o problema da notificação enviada por engano, seu filho foi vítima de outra situação bastante recorrente, desde a edição do CTB, quando as regras ficaram mais rígidas. Ele comprou uma moto usada, pesquisou no sistema do Detran e não havia multas pendentes. Um ano depois, recebeu notificação por infração cometida pelo proprietário anterior. E ainda aguarda solução para o caso.


Trata-se de um desafio para os legisladores de trânsito, que ainda não conseguiram uma saída para acabar com esse problema, que pode ter duas origens. Primeiro: a autuação ainda não virou multa e o veículo pode ser transferido normalmente. O fato passa despercebido por quem está comprando e, quando a notificação vira multa, vai para o endereço do novo proprietário, porque é o que passa a constar no prontuário do veículo. Segundo: essa autuação foi feita por um órgão de trânsito que em determinado momento está sem convênio com o Detran do estado onde está registrado o carro. Então, a infração não aparece no sistema. Quando o convênio é renovado – e pode ser meses ou anos depois –, as autuações são incluídas no sistema e as notificações, enviadas. Por mais estranho que pareça, isso acontece com muita frequência, principalmente quando se trata de autuações feitas pela Polícia Rodoviária Federal. A injustiça é óbvia, mas a reparação não é. O ônus fica com o novo dono do veículo, que, se não conseguir comprovar a situação e ganhar um recurso (ou encontrar o antigo proprietário para fazer um acordo), tem que pagar a multa para regularizar a situação do veículo.

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