Estado de Minas AUTOPEÇAS

Novas fábricas de carros no Brasil enfrentam falta de peças nacionais e recorrem à importação

Setor tem queda no faturamento e não vislumbra oportunidade com novas montadoras no país. Grupo Caoa quer criar condomínio para unir fabricantes e comprar componentes brasileiros


postado em 19/11/2014 12:10 / atualizado em 19/11/2014 12:28

Fábricas como a da Hyundai Caoa, em Anápolis, têm dificuldade em usar componentes nacionais porque fica mais caro(foto: Hyundai/Divulgação )
Fábricas como a da Hyundai Caoa, em Anápolis, têm dificuldade em usar componentes nacionais porque fica mais caro (foto: Hyundai/Divulgação )

Aumentar o índice de nacionalização das peças que compõem um veículo é um dos grandes desafios das montadoras que iniciam novas linhas de montagem no Brasil e, ao mesmo tempo, uma das preocupações do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças), que amarga perda de faturamento no Brasil e não vê boas perspectivas com a chegada de novas fábricas. Pelo contrário. O assunto foi um dos temas discutidos durante o 11º Simpósio SAE Brasil de Tendências, realizado na semana passada, em Belo Horizonte, pela Sociedade de Engenheiros da Mobilidade (SAE Brasil), Seção Minas Gerais. E uma das propostas apresentadas foi a criação de um condomínio industrial de fornecedores para montadoras de baixo ou médio volume, encabeçada pelo Grupo Caoa – importador, fabricante e revendedor de modelos Hyundai no Brasil –, que deverá ser mostrada até o fim do ano ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic).


A nacionalização dos componentes é uma das exigências do programa Inovar-Auto, regime automotivo criado pelo governo federal e coordenado pelo Mdic com o objetivo de promover a competitividade da indústria local. Quanto maior for o índice de nacionalização do carro, maiores serão os benefícios em redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) pela montadora. O problema é que usar peças nacionais na montagem do veículo não é tão simples quanto deveria.

VOLUME “Nacionalizar é o que buscamos, pois ganhamos pontos na equação do Inovar-Auto e crédito em IPI, mas, para as montadoras que produzem em menor volume, o custo é muito alto. Fica muito mais caro do que importar a peça produzida no país de origem”, afirma o diretor de compras da Caoa Hyundai, Ivan Carlos Witt. O Grupo Caoa, responsável pelas importações dos modelos Hyundai, iniciou a construção de uma fábrica em Anápolis (GO), onde atualmente são produzidos os automóveis Tucson, ix35 e os caminhões HR e HD-78. Vale lembrar que não existe relação com a fábrica de Piracicaba (SP), onde são produzidos o HB20 e seus derivados, que são de responsabilidade da matriz coreana Hyundai.

Ivan explica que, para a montadora que produz em baixa ou média escala, é inviável levar o fornecedor para perto da planta, como fazem, por exemplo, as quatro tradicionais (VW, Fiat, Ford e GM), exatamente devido ao menor volume de produção. Além disso, segundo ele, uma mesma máquina não pode ser usada para fazer duas peças diferentes porque a legislação não permite que haja um mesmo CNPJ, o que aumenta mais os custos. “A solução, então, é dividir custos. Por isso, estamos propondo um modelo inovador de condomínio industrial para montadoras que produzem em médio ou baixo volume. A montadora seria beneficiada, o fornecedor e o governo também”, afirma Ivan.


A montadora que produz em baixa ou média escala, é inviável levar o fornecedor para perto da planta, como fazem, por exemplo, as quatro tradicionais (VW, Fiat, Ford e GM)(foto: Wendell Marques/Chery/Divulgação)
A montadora que produz em baixa ou média escala, é inviável levar o fornecedor para perto da planta, como fazem, por exemplo, as quatro tradicionais (VW, Fiat, Ford e GM) (foto: Wendell Marques/Chery/Divulgação)


A ideia, conforme explica o diretor de compras da Caoa, é convidar as montadoras que fabricam em menor escala e estão chegando ao Brasil a fazer parte desse condomínio. Um local comum seria delimitado para a área dos fornecedores, podendo ser compartilhados o maquinário, a matéria-prima e os funcionários. Assim, uma mesma máquina poderia produzir para várias montadoras. “Até então, havia dois modelos. O fornecedor tem a fábrica dele e distribui para a montadora A, B e C. Ou a grande montadora leva o fornecedor para sua planta. Mas agora isso não funciona mais. Precisamos achar algo no meio do caminho. E essa é a nossa proposta”, continua. Ainda conforme Ivan, o condomínio pode ser uma oportunidade para as montadoras que estão vindo para o Brasil. “Mas também fazemos um alerta para as grandes que já estão aqui instaladas, pois, com a entrada de mais 20 montadoras, o volume vai diminuir: ‘vocês são eu amanhã’. Por isso, vale a pena investir”, diz.

QUEDA Antes mesmo que se conclua a construção de muitas das novas montadoras que chegam ao Brasil, a preocupação do Grupo Caoa já é reflexo nas fábricas de autopeças. Representando o Sindipeças, o administrador Flávio Del Soldato relatou perspectivas pessimistas do segmento. Ele mostrou que o faturamento do setor de autopeças vem caindo, apesar do aumento da produção de veículos: em 2011, foram R$ 91 milhões ante R$ 75 milhões de previsão para o fechamento de 2014, mantida para 2015. “Em um primeiro momento, as marcas que chegam montam em regime de CKD (as peças são importadas do país de origem e o carro apenas é montado no Brasil) ou trazem seus fornecedores e têm muito pouco a adquirir no mercado interno”, afirma. “Para isso, é preciso volume, pois os investimentos são altos”, completa.


Soldato acrescenta que mesmo as montadoras de maior tradição no Brasil renovaram recentemente seus portfólios de modelos, sendo muitos derivados de plataformas externas e, consequentemente, com alto conteúdo importado. “Nosso mercado não está condizente com o crescimento do mercado de veículos”, observa. Soldato também afirma que o Sindipeças não tem expectativa com relação ao Inovar-Auto. “Apesar dos benefícios em desconto de IPI, empresas como BMW, Land Rover e outras chegam com pouca capacidade de compra no mercado interno”, afirma. Segundo ele, no decorrer do tempo, pode ser que as novas plantas de veículos venham colaborar para o crescimento do setor de autopeças, mas, por enquanto, o mercado não cresce. “Pelo contrário, só piora. Porque o bolo é o mesmo. E será cada vez mais dividido, com as novas marcas aumentando sua participação, o que diminui a das tradicionais e, consequentemente, a nossa distribuição de peças”, diz. “Cada carro vendido a mais de uma nova montadora que chega é um a menos de uma para a qual já fornecemos.”

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